Ricardo Medina Salla*
28 de dezembro de 2019 | 07h00
Enquanto Estados Unidos e China se digladiam em guerra comercial, e deixam a todos apreensivos com os rumos da economia mundial, as principais economias globais buscam abrigo na redução dos juros, forçando os investidores a abrirem os olhos para negócios que apresentem melhores taxas de retorno. É aí que entram o Brasil e suas vastas prateleiras de produtos de infraestrutura.
Embora os últimos anos tenham afugentado muitos que acreditavam no Brasil, e ainda que a atual cena política persista a irromper constantes arroubos de ignorância, há o que mereça ressalvas e que se deve comemorar: as últimas medidas adotadas pelo governo e os mais recentes índices de crescimento econômico do país trazem otimismo ao mercado nacional. Os pacotes de concessão e privatização são cada vez mais vistos com entusiasmo e cada vez menos com desconfiança.
Não era mesmo de se imaginar que o caminho de recuperação da economia seria percorrido sem obstáculos, nem há que se supor que o Brasil passou, agora, a voar em céu de brigadeiro. No entanto, é perceptível que a arremetida vai, aos poucos, deixando áreas de maior turbulência e alcançando alturas mais alvissareiras.
A nova decolagem da infraestrutura brasileira, impulsionada pela redução dos juros e pela reforma da previdência, ganhou ainda mais projeção, em 2019, com a política de desestatização implantada. Foram 27 ativos arrematados em leilão, destacando-se a, até agora, exitosa arrematação da ferrovia norte-sul, e mais um sem-número de outros projetos empacotados para 2020. Mesmo que se considere demasiadamente ambiciosa, vale ressaltar a meta do Ministério da Infraestrutura para o próximo ano, que é leiloar 44 ativos de infraestrutura e entregar o equivalente a uma obra pública por semana.
As obras ressurgem, os empregos reaparecem e a economia volta a girar. Nesse sentido, é interessante notar que os principais pacotes de concessão vêm sendo lançados por um motivo simples: a demanda. É o mercado que tem compulsado o Governo, seja com vistas a desenvolver parcerias para novos negócios, seja com o intento de dar solução a passivos perenizados pela recessão. São os casos, respectivamente, da Ferrogrão e das devoluções das concessões deficitárias.
A Ferrogrão corresponde a 1142 Km de ferrovia, que liga Lucas do Rio Verde a Miritituba. Trata-se de obra fundamental para escoamento de grãos de Mato Grosso ao Pará, que permitirá o transporte eficiente de cargas ao hemisfério norte e canal do Panamá. Já as concessões deficitárias, em âmbitos rodoviário e aeroportuário, passaram a fruir de segurança jurídica, a partir das Resoluções Normativas 5860/2019-ANTT e 533/2019-ANAC, que vieram para amparar, de forma estável e determinativa, a maneira como se darão as indenizações de investimentos não amortizados. Cuida-se de providência importante e oportuna, pois apenas com as devoluções dos ativos é que a Administração Pública poderá negociar as malparadas concessões com novos investidores.
O arrefecimento das desconfianças do mercado não se justifica apenas pela energia empregada nas iniciativas de desestatização, nem pelos esforços que o Governo projeta empenhar sobre obras de diversas naturezas, como energia renovável, portos, aeroportos, rodovias, óleo/gás e, sobretudo, saneamento. Há efetiva preocupação do Conselho do PPI em conferir segurança jurídica aos novos negócios que serão entabulados.
Para isso, o Governo tem cutucado vespeiros antigos que por muito tempo foram descuidados. São os casos do risco cambial e dos métodos de solução de controvérsias. Neste último tocante, em particular, é notória a intenção de fazer prevalecer mecanismos extrajudiciais, especialmente a arbitragem e os dispute boards (comitês de prevenção e solução de disputas) que, além de conferirem maior celeridade e precisão ao deslinde dos litígios, permite aos investidores estrangeiros se afastarem da constante incógnita que é o judiciário brasileiro.
A infraestrutura brasileira vai decolando e tem grande potencial para, em pouco tempo, chegar a voo de cruzeiro. Reformas importantes foram aprovadas e, embora haja muito ainda por ser feito, os pacotes de concessão e parcerias público-privadas estão finalmente saindo do papel. A tendência é que novos projetos, concorrências e leilões passarão a fervilhar, atraindo o interesse de investidores, multiplicando os contratos e fazendo aquecer a economia.
*Ricardo Medina Salla, sócio do Toledo Marchetti Advogados