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Com o intuito de simplificar os procedimentos de submissão e análise dos requerimentos, bem como a gestão de outorgas dos empreendimentos de geração de energia, a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL publicou, em 16/03/2020 e 13/03/2020, respectivamente, as Resoluções Normativas nº 875/2020 e nº 876, que entrarão em vigor no primeiro dia útil do mês de abril/2020.

 

Tais Resoluções consolidam as normas relacionadas às outorgas para exploração de empreendimentos de geração de energia elétrica por meio dos potenciais hidráulicos e por meio das fontes de energia eólica, fotovoltaica, térmica e outras fontes alternativas, nessa ordem.Com a consolidação, as Resolução Normativas nº 875 e 876 substituíram e revogaram outras 11 Resoluções anteriores: os 141 artigos das Resoluções nº 395/1998, nº 343/2008, Normativa nº 412/2010, nº 765/ 2017, nº 672/2015, nº 673/2015 e nº 680/2015 foram sintetizados em 61 artigos na nova Resolução 875/2020. Já os 102 artigos das Resoluções Normativas n° 390/2009, nº 391/2009, nº 564/2013 e n° 676/2015 deram lugar aos 33 artigos da nova Resolução 876/2020.

 

Vale ressaltar que as novas Resoluções, objeto da Audiência Pública nº 80/2017, consolidaram apenas temas relacionados aos procedimentos e requisitos para autorização de empreendimentos de geração então existentes e não alteraram o mérito das normas revogadas. Desse modo, as Resoluções nº 875 e 876 ainda poderão passar por nova revisão e adequação.

 

  • Resolução nº 875/2020

 

Resumidamente, a Resolução nº 875 trata dos requisitos e procedimentos necessários: (i)  à realização dos Estudos de Inventário Hidrelétrico de bacias hidrográficas; (ii) à obtenção de outorga de autorização para exploração de aproveitamentos hidrelétricos, com potência superior a 5.000 kW e igual ou inferior a 50.000 kW; (iii) à comunicação de implantação de Central Geradora Hidrelétrica com capacidade instalada reduzida, com potência igual ou inferior a 5.000 kW; e (iv) à aprovação de Estudos de Viabilidade Técnica e Econômica de Usina Hidrelétrica sujeita à concessão, com potência superior a 50.000 kW.[1]

 

Quando à outorga de autorização para exploração de aproveitamentos hidrelétricos, prevê o procedimento para obtenção do Despacho de Registro de Intenção à Outorga de Autorização (DRI), cuja publicação dará ensejo à elaboração do Projeto Básico e do Sumário Executivo do empreendimento dentro do prazo de 14 (quatorze) meses. A ANEEL analisará o Sumário Executivo, que deverá ser compatível com os Estudos de Inventário Hidrelétrico e com o uso do potencial hidráulico, decidindo pela publicação ou não do Despacho de Registro da Adequabilidade do Sumário Executivo (DRS), o que permitirá que a ANEEL solicite a Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica (DRDH) e que o interessado requeira o Licenciamento Ambiental pertinente.

 

Após a obtenção da DRDH e do Licenciamento Ambiental pertinente, o interessado cujo empreendimento é objeto de DRS válido deverá apresentar o requerimento de outorga de autorização, que deverá ser acompanhado dos documentos indicados no Anexo IV da Resolução (Garantia de fiel cumprimento; Regularidade Fiscal; Qualificação jurídica; Qualificação Técnica).

 

Atendidos os requisitos necessários, a ANEEL emitirá a outorga de autorização, que terá vigência de 35 (trinta e cinco) anos.

 

Quanto à outorga de concessão para exploração de aproveitamentos hidrelétricos denominados Usina Hidrelétrica (UHE) cuja potência superior a 50.000 kW, previstos ou não no Planejamento Indicativo do Setor Elétrico, os interessados deverão apresentar os Estudos de Viabilidade Técnica e Econômica (EVTE) e solicitar a sua inclusão no programa de licitação de concessões. Caso o pleito seja considerado válido, após a aprovação do EVTE, a ANEEL iniciará o procedimento de licitação para outorga de concessão.

 

  • Resolução nº 876/2020

 

Por sua vez, a Resolução nº 876 trata dos requisitos e procedimentos necessários: (i) à obtenção de outorga de autorização para exploração de centrais geradoras Eólicas (EOL), Fotovoltaicas (UFV), Termelétricas (UTE) e outras fontes alternativas, com potência superior a 5.000 kW; (Ii) à alteração da capacidade instalada dessas usinas; e (iii) à comunicação de implantação de centrais geradoras com capacidade instalada reduzida.[2]

 

Quanto à outorga de autorização, em um primeiro momento, o interessado poderá requerer o registro do requerimento de outorga de autorização para exploração de EOL, UFV, UTE e outras fontes alternativas com potência superior a 5.000kW à ANEEL. Para tanto, deverá apresentar os documentos que demonstrarão sua regularidade fiscal, sua qualificação jurídica e sua qualificação técnica, em conformidade com a relação de documentos exigidos no Anexo I da referida Resolução.

 

Os requerimentos de outorga para exploração de EOL, UFV, UTE e outras fontes alternativas com potência superior a 5.000 kW apresentados à ANEEL serão objeto de publicação de Despacho de Registro do Requerimento de Outorga (DRO), o qual terá como finalidade (i) facilitar a obtenção de eventuais pedidos de informação de acesso pela concessionária de distribuição de energia elétrica, ou pela concessionária de transmissão de energia elétrica ou pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS e (ii) facilitar a obtenção de licenças e/ou autorizações dos órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental ou de outros órgãos públicos federais, estaduais, municipais ou do Distrito Federal.

 

O DRO conferirá ao seu titular o direito para implementar o empreendimento, cujo início de operação em teste ficará condicionada à emissão do competente ato de autorização. É o que se depreende do disposto no art. 7º da Resolução nº 876/2020, que garante ao interessado que, após a publicação do DRO, possa “empreender as ações necessárias à implantação do empreendimento, inclusive iniciar a sua construção, por sua conta e risco”.[3]

 

Evidentemente, caberá ao interessado cumprir as obrigações ambientais e as exigências dos demais órgãos públicos federais, estaduais e municipais ou do Distrito Federal (art. 7º, §1º, da Resolução).

 

É certo que o descumprimento de qualquer das exigências legais ou da Resolução implicará no indeferimento do requerimento da outorga (cf. art. 9º). A não apresentação de algum dos documentos exigidos no Anexo I ocasionará o arquivamento do processo de outorga até o integral cumprimento de todas as exigências (cf. art. 10).

 

Caso não opte pela adoção do procedimento de solicitação de Despacho de Registro do Requerimento de Outorga (DRO), a empresa interessada deverá solicitar diretamente a outorga de autorização.

 

Nesse caso, a autorização para exploração de EOL, UFV, UTE e outras fontes alternativas com potência superior a 5.000kW será requerida mediante a apresentação dos documentos relacionados no Anexo I e no Anexo II da Resolução 876/2020.

 

Dessa maneira, além daqueles documentos que buscam aferir a capacidade do interessado para implementação do projeto (Anexo I da Resolução), será analisada a documentação mais intrinsecamente relacionada ao empreendimento propriamente dito, de acordo com o rol que integra o Anexo II da Resolução.

 

A outorga de autorização terá vigência de 35 (trinta e cinco) anos.

 

Para obter a outorga de autorização de EOL, o interessado deverá apresentar a garantia de fiel cumprimento no valor de 5% (cinco por cento) do investimento, que poderá ser substituída por outras modalidades aceitas pela ANEEL, de valores progressivamente menores, à medida que, mediante comprovação junto à fiscalização da Agência, forem sendo atingidos os marcos indicados no art. 13, §9º, incisos I a III.

 

Verifica-se que as novas Resoluções atendem antecipadamente o disposto no Decreto nº 10.139, de 2019 que entrou em vigor em 03/02/2020. Segundo tal Decreto, todos os atos normativos inferiores a decreto, editados por órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, deverão passar por revisão, consolidação e/ou revogação, com início das fases de revisão previsto para 29/05/2020 e término previsto para 31/05/2021.

 

A consolidação adotada pela ANEEL beneficia a segurança jurídica nos negócios do setor elétrico, na medida em que uniformiza certos procedimentos regulatórios que antes se mostravam esparsos.

 

As equipes de Direito Público/Regulatório e de Projetos de Toledo Marchetti Advogados ficam à disposição para eventuais esclarecimentos que se façam necessários.

 

João Paulo Pessoa – [email protected]
Taisa Ide Hasimoto – [email protected]

 

 


[3] Também o que diz o art. 8º da Resolução: “O interessado somente poderá conectar-se ao sistema elétrico, bem como iniciar a operação em teste e comercial do empreendimento, após a publicação do ato de outorga de autorização para a exploração da central geradora e a celebração dos contratos de conexão e uso da rede elétrica conforme regulamentação da ANEEL, quando couber.

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João Paulo Pessoa e João Marcos Neto de Carvalho*

27 de março de 2020 | 16h15

 

João Paulo Pessoa e João Marcos Neto de Carvalho. FOTOS: DIVULGAÇÃO

 

Tem-se visto, nos últimos dias, uma profusão de normas jurídicas restritivas a diversas atividades econômicas sob o argumento de diminuir os impactos da pandemia do coronavírus. Além de Medidas Provisórias editadas pelo presidente da República, são inúmeros os decretos estaduais e municipais que reconhecem o estado de calamidade pública em seus territórios e decretam a quarentena para diminuir a locomoção de pessoas.

 

Não se discute a importância de que sejam tomadas medidas excepcionais num contexto totalmente atípico e tão sensível. Evidentemente, o Poder Público deverá se pautar pelas limitações constitucionais aos atos administrativos (legalidade, dever de motivação etc.) e garantias dos direitos fundamentais, pautando-se pela razoabilidade e proporcionalidade em suas escolhas.

 

Mais preocupante, contudo, tem sido a adoção desvairada, nas inúmeras esferas federativas, de atos restritivos que colidem com decisões de outros entes federativos, ocasionando enorme insegurança jurídica. Situações mais emblemáticas desse tipo são as tentativas dos Municípios de bloquearem estradas para proibir o ingresso de pessoas em seu território. Já é de conhecimento público que a doença (covid-19) causada pelo coronavírus foi reconhecida como pandemia pela OMS. Isso implica reconhecer que soluções municipais isoladas não serão suficientes para combater da melhor forma possível tal pandemia.

 

Ações açodadas e conflitantes, ao invés de contribuir para o eficiente combate à pandemia do coronavírus, servirão apenas para gerar cada vez mais insegurança e confusão num momento que exige coordenação e cooperação de todos, especialmente do setor público.

 

É preciso que os entes federativos reconheçam que a Constituição impõe uma ação coordenada e cooperativa entre eles, tendo instituído um sistema federativo cooperativo. A Constituição estruturou um complexo sistema de repartição de competências que busca, em última análise, de preservar a coexistência harmônica entre os entes federativos. Contemplou cada ente com competências próprias, adotando o princípio da predominância do interesse.

 

Sem olvidar os conflitos que podem decorrer da execução das competências federativas, a Constituição prevê que “leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional” (art. 23, parágrafo único).

 

Evidentemente, o processo de aprovação de uma Lei Complementar não é simples, exigindo aprovação por maioria qualificada. Por essa razão, não se imagina que teremos uma Lei federal equalizando o papel de cada ente federativo no enfrentamento de calamidades públicas com fortes impactos nos próximos dias.

 

Enquanto não imperar o bom senso e o diálogo entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e, na ausência destes, inexistir uma norma jurídica mais clara para delimitar uma atuação coordenada entre os entes federativos em momentos de crise como a que estamos vivenciando, caberá ao Judiciário solucionar os inúmeros conflitos que estão existindo.

 

É o caso da decisão do Presidente Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de 22/03/2020, que acolheu Pedido de Suspensão de Liminares proposto pelo Estado de São Paulo[1] para reestabelecer o fluxo em diversos trechos de rodovias que haviam sido bloqueados por decisões liminares proferidas em ações civis públicas propostas por alguns Municípios e pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. A decisão reconhece que “medidas necessárias à contenção da pandemia de covid-19 precisam ser pensadas em um todo coerente, coordenado e sistêmico” e que “a coordenação, a ser exercida pelo Poder Executivo, é imprescindível. Somente uma organização harmônica e organizada ensejará a adoção das medidas necessárias e abrangentes. Nesse contexto, aliás, a recente e louvável determinação de quarentena em todo o Estado de São Paulo”.

 

No âmbito do Estado de São Paulo imperam, portanto, os Decretos editados pelo Governo estadual, os quais, por imporem medidas restritivas, devem ser interpretados restritivamente, em especial quanto às atividades que devem ser suspensas.

 

Daí porque a pretensão de alguns municípios paulistas de suspender as obras de construção civil deve ser analisada em conformidade com o Decreto nº 64.881/2020, que decretou a quarentena no Estado de São Paulo, e com o Decreto nº 64.864/2020, que instituiu o Comitê Administrativo Extraordinário Covid-19.

 

Coube ao referido Comitê Administrativo esclarecer, por meio da Deliberação 2, de 22/03/2020, que não estão abrangidas pela medida de quarentena, dentre outras atividades lá elencadas, “construção civil e estabelecimentos industriais, na medida em que não abranjam atendimento presencial ao público”.

 

Além disso, a mesma Deliberação pontuou que o Decreto estadual prevalece sobre normas em sentido contrário editadas pelos Municípios: “a decretação de quarentena levada a efeito pelo Decreto nº 64.881, de 22 de março de 2020, na medida em que objetivou conferir tratamento uniforme a restrições direcionadas ao setor privado estadual, prevalece sobre normas em sentido contrário eventualmente editadas por Municípios”.

 

As recentes decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade de alguns dispositivos da Lei nº 13.979/2020 e das alterações promovidas pelas Medidas Provisórias nº 926 e 927, são outros exemplos dessa situação. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6343, por exemplo, o Min. Marco Aurélio indeferiu o pedido liminar formulado pelo partido Rede Sustentabilidade para que fossem suspensos os dispositivos que tratam do transporte intermunicipal durante a pandemia do novo coronavírus. De acordo com a decisão, “o momento é de crise aguda envolvendo a saúde pública. Tem-se política governamental nesse campo, com a peculiaridade de tudo recomendar o tratamento abrangente, o tratamento nacional”.

 

É importante ressalvar que não se nega a cada ente federativo competência para adotar medidas que objetivam o combate à pandemia do coronavírus. Deve-se ter em mente, contudo, que esse enfrentamento dependerá de uma ação coordenada e conjunta entre os diversos entes federativos. É o momento de prestigiar o federalismo cooperativo, ao invés do federalismo caótico, que é contrário ao mínimo de segurança jurídica necessária para o eficaz engajamento da sociedade no enfrentamento da pandemia do coronavírus.

 

*João Paulo Pessoa e João Marcos Neto de Carvalho são advogados do Toledo Marchetti Advogados

 

[1] Processo nº 2054679-18.2020.8.26.0000.

 

 

https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/infraestrutura-federalismo-caotico-e-pandemia/

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Através da Portaria Conjunta RFB/PGFN nº 555, editada pelo Secretário Especial da Receita Federal do Brasil e o Procurador Geral da Fazenda Nacional, publicada no Diário Oficial da União no dia 24 de março, em reconhecimento aos impactos da pandemia relacionada ao coronavírus (COVID-19), que está dificultando a regularização fiscal necessária para a expedição de novas certidões de regularidade fiscal, decidiram prorrogar, por 90 (noventa) dias, a validade das Certidões Negativas de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CND) e Certidões Positivas com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CPEND) que estivessem válidas na data da publicação da Portaria Conjunta.

 

O texto, na íntegra, pode ser consultado abaixo:

 

“Portaria Conjunta RFB / PGFN nº 555, de 23 de março de 2020

 

Dispõe sobre a prorrogação do prazo de validade das Certidões Negativas de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CND) e Certidões Positivas com Efeitos de Negativas de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CPEND), em decorrência da pandemia relacionada ao coronavírus (COVID-19).

 

O SECRETÁRIO ESPECIAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL E O PROCURADORGERAL DA FAZENDA NACIONAL, no uso das atribuições que lhes conferem, respectivamente, o inciso III do art. 327 do Regimento Interno da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria MF nº 430, de 9 de outubro de 2017, e o art. 82 do Regimento Interno da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pela Portaria MF nº 36, de 24 de janeiro de 2014, e tendo em vista o disposto no § 5º do art. 47 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, resolvem:

 

Art. 1º Fica prorrogada, por 90 (noventa) dias, a validade das Certidões Negativas de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CND) e Certidões Positivas com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CPEND) válidas na data da publicação desta Portaria Conjunta.

 

Art. 2º Ficam mantidas as demais disposições da Portaria Conjunta RFB/PGFN nº 1.751, de 2 de outubro de 2014.

 

Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.”

 

A equipe de Direito Tributário de Toledo Marchetti Advogados fica à disposição para eventuais esclarecimentos que se façam necessários sobre a matéria em questão, bem como quaisquer dúvidas sobre os impactos da pandemia relacionada ao coronavírus (Covid-19) no cumprimento de obrigações tributárias.

 

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Adriana Sarra e Lucas Farah*

19 de março de 2020 | 04h00

Adriana Sarra e Lucas Farah. FOTOS: DIVULGAÇÃO

 

Como é de conhecimento público, o coronavírus (covid-19) está causando diversos impactos em variados setores da indústria brasileira. O vírus já causou a suspensão das aulas de escolas, faculdades e o cancelamento/adiamento de diversos eventos com número elevado de participantes. Apesar de ainda não serem quantificáveis os prejuízos que o vírus trará ao setor de infraestrutura e construção, não há como negar as relevantes dimensões que poderão alcançar, a depender dos desdobramentos da pandemia sobre perda de produtividade, quebra da sequência de fornecimentos, falta de matérias primas e peças, suspensão de atividades etc.

 

Assim, este breve artigo tem como objetivo destacar os principais pontos que devem concentrar a atenção dos agentes do mercado de construção e infraestrutura, diante da instabilidade provocada pela covid-19.

 

  • Contrato: quais as regras aplicáveis?

 

O primeiro passo é reler o Contrato e analisar a forma como os riscos se encontram alocados entre as Partes. Especial atenção merece a cláusula que regulamenta as hipóteses de caso fortuito e força maior, bem como as de excessiva onerosidade por eventos supervenientes. Cada contrato adota uma técnica própria para esses tipos de cláusula, estipulando, por exemplo, sobre o tipo de evento que faz configurar a força maior, bem como as consequências que se seguem no caso de sua constatação.

 

A depender de como esteja estruturada a cláusula, é possível que desde logo se identifique uma solução para o enquadramento jurídico da pandemia causada pela covid-19. Em outros casos, porém, é possível que a cláusula seja amplamente afastada ou simplesmente omissa, de modo que um posicionamento sobre o assunto dependerá de maior esforço interpretativo.

 

Em se tratando de contratos que seguem o modelo FIDIC, por exemplo, a cláusula 18 do Red Book prevê as hipóteses de “eventos extraordinários” que estão fora do controle das partes. Apesar de não haver previsão específica para eventos biológicos que causem crise na saúde pública (como epidemias e pandemias), os exemplos trazidos na cláusula não são exaustivos e permitem a inclusão de outras situações que preencham os requisitos estipulados na cláusula – recordando-se sempre que as Condições Gerais podem ser alteradas ou complementadas nas Condições Especiais do Contrato.

 

Se as cláusulas contratuais não previrem solução clara, as Partes podem acabar sujeitas quase que exclusivamente àquilo de que dispõe a legislação, o que não deverá oferecer-lhes melhor interpretação. Isso porque, no caso de contratos privados, o Código Civil é exageradamente genérico ao tratar da força maior, resumindo-se a dizer que o devedor restará isentado de sua obrigação (artigo 393). Já o dispositivo que regulamenta a teoria da imprevisão tampouco poderá contribuir, uma vez que, para readequar as condições originais do contrato, o artigo 478 do Código Civil,  mais que onerosidade excessiva do devedor, exige que o credor esteja a se aproveitar de vantajosidade extremada (algo improvável de se vislumbrar em momentos de crise como este que se está a enfrentar). Em se tratando de contratos públicos, recomenda-se relembrar o que estabelecem as regras que autorizam o reequilíbrio econômico-financeiro, previstas no artigos 57 e 65 da Lei nº 8.666/1993, sendo aplicável o Código Civil subsidiariamente.

 

  • Gestão da obra: o que fazer?

 

Uma vez ciente da regulação aplicável às situações de eventos imprevisíveis, é fundamental que donos de obra, construtoras e fornecedores tenham muito zelo e atenção na elaboração dos registros. Diários de obra, atas de reunião, relatórios mensais e, a depender do caso, também as notificações devem registrar os impactos (ou a sua ausência) no período de influência da pandemia. É o caso, por exemplo, de falta de pessoal ou de equipamentos, demora no recebimento de insumos, materiais e outros bens adquiridos, redução de produtividade, reprogramação de atividades ou, até mesmo, suspensão dos trabalhos.

 

Esses registros passam a ter importância redobrada, pois vêm a ser uma das mais importantes provas que as Partes podem produzir sobre a existência ou não de impactos causados pela covid-19. Muitas vezes, a cláusula de Força Maior estabelece um prazo para a comunicação de qualquer evento. Assim, todos esses registros devem ser comunicados à outra parte para que não se abra margem a alegações de desconhecimento de eventos/fatos em possíveis pleitos futuros (observando-se, sempre que houver, os ritos de comunicação especificamente estipulados no contrato).

 

  • Gestão da obra: o que não fazer?

 

Os contratos de obra, por sua natureza, estão sujeitos a um dever geral de cooperação entre as partes, decorrente do princípio da boa-fé objetiva. Isso significa que, diante de um evento que impacta a relação contratual, devem ambas as partes atuar no sentido de prezar pela continuidade de sua relação e de minimizar os prejuízos causados. Em termos práticos, isso significa que tanto a parte prejudicada, quanto a sua contraparte têm o dever de agir de forma a não agravar aumentos de custos e impactos nos prazos. Paralisar por completo uma obra quando apenas uma frente de trabalho ou apenas uma atividade foi impactada, por exemplo, poderá reduzir eventual direito ao pagamento dos custos adicionais incorridos.

 

  • Gestão da obra: como remediar?

 

Identificados os impactos e feitos os devidos registros, é preciso definir a estratégia de ação. Esta dependerá, acima de tudo, da resposta à primeira das perguntas, ou seja, da definição de como foi distribuída a alocação dos riscos associados a eventos como a pandemia da covid-19, bem como de eventual regulação contratual sobre as consequências de sua caracterização. Sendo o risco alocado inteiramente ao construtor, é preciso avaliar a conveniência de se implementar, por exemplo, um possível plano de recuperação. Sendo, por outro lado, o risco alocado inteiramente ao dono da obra, é possível cogitar tanto de uma extensão do prazo de entrega, quanto de um plano de aceleração dos trabalhos. A solução mais adequada para cada caso dependerá da análise das circunstâncias concretas.

 

Existe, ainda, a possibilidade de se estudar o acionamento de eventual apólice de seguro, com o objetivo de receber indenização pelos custos adicionais e eventuais perdas causadas em razão dos impactos. Nesse caso, será preciso avaliar cuidadosamente as condições e coberturas contratadas, para verificar se sinistros causados por pandemias seriam caracterizados como danos indenizáveis.

 

  • Claims: o que pedir e como se defender?

 

Uma vez verificada a alocação de riscos no contrato e quantificados os impactos causados, inclusive de eventuais medidas de remediação, tem-se o cenário em que pode haver a formulação de claims entre os envolvidos. Nessa situação, tanto a preparação do pedido quanto a da defesa terão o seu sucesso diretamente ligados à determinação das regras que governam a relação entre as partes e à qualidade dos registros realizados. Por essa razão, reforça-se novamente a extrema importância dos registros para essa fase de apresentação, defesa e negociação de claims.

 

Além disso, devem as partes se atentar para os procedimentos contratuais de apresentação e defesa de pleitos. Um foco de atenção consiste nos ritos e prazos definidos no contrato, já que é comum haver prazos que se enunciam como decadenciais, ou seja, prazos cuja expiração implicaria a extinção do direito de pedir ou de se defender. Também é preciso verificar a previsão de eventual dispute board no contrato, já que a sua presença ao longo da execução da obra ou a sua constituição para analisar uma divergência específica pode se mostrar uma solução eficiente e benéfica para a obra, caso as partes não entrem em acordo sobre o claim apresentado.

 

*Adriana Sarra e Lucas Farah, advogados do Toledo Marchetti Advogados

 

https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/como-o-coronavirus-pode-afetar-a-sua-obra/